Havia semanas que a casa gemia. Não era um gemido que o vento pudesse justificar — havia nele uma cadência irregular, como um suspiro contido por séculos. Eu o ouvia sempre ao cair da noite, quando as sombras dos móveis se alongavam, arranhando o chão como dedos deformados.
Meu quarto ficava no andar superior, e a única janela dava para o jardim abandonado. Desde a primeira noite, notei que, na escuridão, algo se movia ali fora — não como um homem ou um animal, mas como uma presença que não aceitava ser vista por completo. Ainda assim, eu sentia… seus olhos.
As tábuas do assoalho rangiam sob meus pés quando, certa madrugada, decidi olhar diretamente para a janela. E ali estava — um rosto. Pálido demais, fixo demais. Não piscava. Os lábios, finos como um corte, tremiam quase imperceptivelmente, e ao redor deles havia uma mancha escura que não era sombra.
Acordei na manhã seguinte com a janela fechada e trancada por dentro. Jurei que não havia tocado nela. Mas o chão… ah, o chão guardava as marcas. Passos pequenos, desiguais, que vinham de dentro do quarto e paravam diante do vidro.
Desde então, não durmo mais. Não por medo de ver o rosto outra vez… mas pelo receio de vê-lo do lado de dentro.